sexta-feira, 3 de abril de 2009

O papel da madrasta


O papel da madrasta

Úrsula: No bloco de comportamento de hoje, vamos conversar com Ronaldo Miguez sobre o papel da madrasta, que não é nada fácil. Na literatura infantil, as madrastas são em geral vistas como pessoas más, que procuram maltratar os filhos que não são delas. Esse conceito está mudando?

Ronaldo: Está sim Úrsula. Com o aumento do número de separações e recasamentos, o papel de madrasta vem sendo assumido por um número muito maior de mulheres. Como a situação vem se tornando comum, as pessoas estão refletindo mais sobre isso, e aquela aversão que a madrasta costumava ter pelos filhos da outra tende a desaparecer. Da mesma forma, os enteados parecem estar se adaptando mais rapidamente a nova companheira do pai.

Úrsula: Do ponto de vista prático, quais são as maiores dificuldades que a mulher encontra para lidar com essa situação?

Ronaldo: O primeiro grande problema é que os filhos do marido estão em geral muito ressentidos com a separação, e isso precisa ser encarado com maturidade, porque a separação dos pais causa nas crianças uma sensação de perda muito grande, as vezes quase tão intensa quanto aquela que se tem quando morre uma pessoa querida. A madrasta pode ser sentida num primeiro momento, como alguém que veio para aumentar essa perda. É possível que esse trauma desencadeie sentimentos de rejeição pela nova companheira do pai, que eles façam comparações desfavoráveis entre ela e a mãe, e até provocações. Que eles sintam que sua família esta sendo invadida por uma mulher estranha. Mas essas reações não devem ser vistas como maldade. Elas são fruto de um problema emocional muito doloroso criado com a separação, uma separação da qual as maiores vítimas são sempre os filhos. Um segundo ponto é a interferência da ex-mulher, sobretudo quando ainda permanecem ressentimentos, e não raramente de ex-sogra, ex-cunhado, sobrinhos, e até amigos comuns do antigo casal. Esse ponto precisa ser negociado de forma adequada pelo casal, e encarado como um desafio para os dois. É bom que ambos estejam em harmonia, tenham uma visão semelhante sobre o problema.

Úrsula: Como deve agir então a mulher para desempenhar bem esse papel? Quais seriam as dicas?

Ronaldo: Em primeiro lugar Úrsula, mulheres com baixa auto-estima tem mais dificuldade de exercer o papel de madrasta por causa dos ciúmes. Por outro lado, é preciso que a madrasta não tente ser a substituta da mãe, ser mais amada do que a mãe, ou ser melhor do que ela em tudo, nem se dedique a influenciar os enteados contra a mãe. Ela não precisa disso porque seu papel é diferente. Ela tem que ser apenas ela mesma, ela não tem que ser a mãe. Se fizer isso vai viver no passado, vai deixar que o passado influencie a sua nova vida. Ela tem que construir uma outra história. A mãe biológica, por outro lado, é insubstituível na vida de qualquer pessoa, e além disso as pessoas não precisam se iguais. A madrasta não deve tentar conquistar seu espaço impondo sua figura de forma autoritária, brigando o tempo todo para chamar a atenção sobre si. O recasamento é um tipo de relação que pode precisar de acomodações progressivas, e que só amadurece com o tempo, com paciência. É preciso ter lógica, plantar sementes com sabedoria e aguardar o momento da colheita. Mas existem também casos em que a adaptação dos enteados à madrasta é bem mais simples. Depende até do tipo de educação que receberam dos pais, da mentalidade familiar, etc.

Úrsula: Ronaldo, como fica o problema da autoridade. Essa parte é bastante difícil porque em geral eles não aceitam a autoridade da madrasta não é?

Ronaldo: É verdade. Por isso essa autoridade precisa ser racional e não pode partir só da madrasta. É preciso envolver sempre o pai, e decidir tudo, de preferência, na presença dele.

Úrsula: E que posição a madrasta deve adotar em relação à mãe biológica para não aumentar os conflitos? Como deve referir-se a ela, por exemplo.

Ronaldo: É bom evitar se posicionar contra ela fazendo criticas ou insinuações, porque isso fere as crianças e provoca um leva-e-trás que depois assume proporções incontroláveis. Mesmo quando parte das próprias crianças a censura, a madrasta deve abster-se de se envolver demais. Se for inevitável, procurar sempre uma atenuante. É bom também ficar o mais distante possível dos problemas do marido com a ex-mulher. Não se deve deixar influenciar pelas reclamações do marido contra a ex-esposa, porque essa visão geralmente está deturpada pelo ponto de vista pessoal. Outra coisa importante, é não ficar pensando o tempo todo que o marido vai reatar a qualquer momento com a ex, discutindo isso na frente das crianças. Essa paranóia complica muito e afeta as crianças. Quando os enteados, entretanto, percebem que a madrasta não está contra a mãe biológica, nem contra eles, e deseja ter apenas uma vida normal, sem tentar destruir os valores familiares que foram gerados no passado, é muito mais fácil aceita-la e conviver com ela.

Úrsula: No quadro de comportamento da semana que vem, Ronaldo Miguez volta para nos falar de um novo tema.


Entrevista realizada no estúdio da Rádio Geração 2000, 1580 AM, em fevereiro de 2009, Teresópolis, RJ.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário nos ajuda a aprimorar as matérias e encontrar focos de interesse que possamos explorar.