terça-feira, 31 de março de 2009

Prazer químico vale a pena?

Prazer químico vale a pena?


Gabi: Ronaldo, porque o prazer químico oferecido por drogas como a cocaína, o álcool e o cigarro, atrai tanto as pessoas?
Entrevista
Ronaldo: Em primeiro lugar, porque ele é fácil. É um prazer que voce pode comprar, não precisa conquistar. As pessoas despreparadas, que não estão conseguindo enfrentar positivamente os problemas da vida, podem fazer disso uma saída. Enquanto o efeito depressor não aparece, ou a chamada tolerância física não se acentua, a pessoa tem a sensação de que encontrou uma coisa maravilhosa. Em segundo lugar, porque as pessoas são bombardeadas por uma verdadeira avalanche de estímulos pró-droga, que vem através de fatores como impunidade, propagandas e comerciais veiculados pela mídia, e filmes que glamourizam a imagema de traficantes ricos e poderosos. A droga esta associada ao prazer de viver, à coragem, ao charme, a liberdade e até mesmo a prática sexual. Vide o ecstazy , que é usado, sobretudo, como forma de ativar a libido. A experiencia com a droga pode suprimir de imediato a carencia emocional, ou a dor psicológica, mas ao mesmo tempo em que alivia ela paralisa a busca natural pelo prazer, que só se realiza mediante o auto-desenvolvimento. Cria-se com a droga uma expectativa falsa em relação a busca do bem estar, porque na verdade ele nunca é encontrado a não ser ficticiamente. Num primeiro momento, isso pode parecer muito bom, depois não, mas é difícil fazer o usuário, sobretudo nos primeiros estágios, compreender isso. Se o prazer químico não trouxesse males gravíssimos para a saúde física e mental, nada se poderia falar dele, mas drogas não são vitaminas, são corrosivos.
Entrevista
Gabi: A propaganda influi no desenvolvimento do vício?

Ronaldo: A propaganda sempre ajudou a divulgar as drogas. Primeiro foi o cigarro e o álcool, depois de forma indireta os narcóticos, que sempre mostram traficantes rodeados de luxo e prazer. Isso numa sociedade capitalista, que mantém a situação de exclusão como parte do sistema, não pode deixar de ser um atrativo para quem não tem perspectivas. A influencia dos usuários - que já são uma multidão - sobre os abstêmios, também é muito grande, e hoje isso já começa cedo nas escolas. Nós temos uma verdadeira lavagem cerebral acontecendo em todos os níveis sociais. As companhias de cerveja encomendam das agencias publicitárias comerciais com características de sedução para a infância. Elas também usam pessoas famosas nas propagandas para associar alegria, sucesso e descontração a imagem da bebida, assim como as fábricas de cigarro associaram durante muito tempo tabaco à saúde, esporte e independência, criando valores que já fazem parte da educação que se recebe dentro de casa, ou seja, de certa forma, as pessoas estão sendo educadas para pensar que sem aditivos químicos não há festa, não há alegria, não há realização. Com a queda no índice de fumantes, aumentou o contingente de bebedores. Isso se deu na mesma medida em que aumentou o volume de dinheiro investido pelas cervejarias na propaganda de bebidas alcoólicas, fruto da enorme concorrência entre elas.
Entrevista
Gabi: Ronaldo, a sociedade moderna induz grande parte das pessoas a frustração e a depressão. Na brecha das desigualdades sociais, ou no terreno onde operam as propagandas que seduzem pessoas para o vício, como encontrar espaço para ser feliz por si mesmo?


Ronaldo: Não se acovardando jamais diante dos desafios naturais da vida, não abandonando a responsabilidade sobre si mesmo, não deixando de acreditar no resultado do esforço pessoal e do bem senso. Da mesma forma que se caminha por uma estrada até o fim para chegar ao objetivo, deve-se perseverar no auto-aprendizado para se chegar a superação e a felicidade. O alcoolista, ou o usuário de drogas como a cocaína e a maconha, são pessoas que se sentaram à beira da estrada e pararam de acreditar em si mesmos. Eles transferiram a responsabilidade de viver e ser feliz para um copo de cerveja ou de cachaça, ou ainda para um papelote de cocaína.

Gabi: Mas não existem aqueles que se consideram bebedores sociais?

Ronaldo: Por quanto tempo é o que importa saber. Todas as pessoas que tiveram a vida ou a saúde destruída pelo álcool, se disseram um dia bebedores sociais. Disseram também que parariam quando quisessem porque não eram viciados. Mas nunca conseguiram parar e entraram em processo de degeneração. O bebedor social é constantemente estimulado a beber cada vez mais. O que interessa de fato é saber para que se bebe? Para fingir que se esta feliz? Para se ter coragem de fazer coisas que em sã consciência não se teria coragem de fazer? Para vencer mágoas, angústias, ou a insegurança que deveria ser superada pelo próprio indivíduo ao invés de ser abafada com drogas? Nós estamos criando uma sociedade cruel para com as crianças e os jovens, porquê permitimos que o dinheiro compre as nossas consciências. Os Estados Unidos só resolveram combater o uso do cigarro quando os prejuízos para o sistema público de saúde se tornaram insuportáveis. Enquanto os impostos superavam os prejuízos eles toleraram. O mesmo acontece com o álcool. Vai chegar uma hora em que os governos vão ser obrigados a combatê-lo pesadamente como fizeram com o cigarro, porque o alcoolismo esta aumentando em todo o mundo, e já é um problema de saúde pública no Brasil e em vários países do mundo.
Entrevista
Gabi: Na sua forma de pensar as pessoas deveriam usar o álcool de uma forma moderada, ou não deveriam usar nunca?

Ronaldo: Essa forma moderada gabi é muito difícil. São raros os casos em que uma pessoa consegue ser um bebedor moderado por muito tempo. A gente precisa entender que a bebida alcoólica é viciante como o cigarro ou qualquer outra droga, e além disso ela altera a consciência levando a comportamentos reprováveis. Existem drogas que viciam mais rapidamente, mas todas têm a mesma propriedade, isto é, são capzes de tornar o usuário um dependente. Existe uma coisa chamada tolerancia, ou seja, o corpo se acostuma à química e vai exigindo doses cada vez maiores para reproduzir o efeito esperado. A Organização Mundial de Saúde afirma que pessoas que bebem toda semana, já podem ser consideradas alcoólatras, mesmo que não estejam se encharcando, porque isso já evidencia um caráter de dependência. O aumento da quantidade pode ser uma questão de tempo, e será fatal caso a pessoa persista no uso. Existem pessoas que beberam durante muito tempo socialmente, mas 15, 20 ou 30 anos depois, perderam o controle e tiveram a vida destruída. É só aparecer um ponto crítico e o alcoolismo pesado pode ser desencadeado quando o indivíduo já é bebedor. O poder viciante é muito forte, e pode ser potencializado ainda por uma predisposição genética. As companhias de cigarro, por exemplo, têm engenheiros químicos para estudar formas de aumentar o prazer que a nicotina causa ao corpo, fazer com que ela chegue mais rápido ao cérebro, porque isso aumenta o pode viciante e o consumo. Não existe nesse mercado qualquer consideração de ordem ética em relação à saúde e ao bem estar das famílias ou dos indivíduos, que hoje se sabe, claramente, que envolve as piores expectativas possíveis. Quanto mais viciante for a droga, mais dependência psicológica e física ela traz, maiores males ela acarreta, porque o corpo desaprende sua própria capacidade de produzir prazer e adoece. Até o prazer sexual vem sendo tratado por grande parte da juventude como algo que precisa ser incentivado químicamente para ser bom. Em pouco tempo, eles se tornarão incapazes de sentir prazer naturalmente. A droga já é hoje uma das força mais destrutivas da nossa sociedade. Ela traz violência, corrupção, destruição de famílias e acaba com o sentido natural da vida. Se os homens se interessassem mais pelas questões sociais e psicológicas, poderiam aprender mais sobre si mesmos e então saberiam viver sem drogas. Nós temos potenciais ilimitados que a droga mata ao invés de estimular. Precisamos aumentar a responsabilidade e o esclarecimento nesse sentido. Com uma postura mais esclarecida e pró-ativa, ninguém precisaria recorrer ao auxílio das drogas, quando pode conquistar tudo o que quiser, e muito mais, através da sua propria capacidade.

Gabi: Ronaldo, e com relação a religião. Ela ajuda a manter longe das drogas?

Ronaldo: Gabi, a religião é sempre um poderoso auxílio nesse sentido, mas pode não ser tudo. Depende da forma como o indivíduo encara a fé, e ainda se precisa saber como é que ele lida consigo mesmo. Traficantes falam em Deus, ditadores falam em Deus. Se for simples questão de crença, pode não representar muito. Existem muitos religiosos que usam bebidas alcoólicas e fumam, sem perceber a grande contradição que existe entre necessitar de ajuda química para se sentir bem e ter uma fé que deveria oferecer todas esas compensações sem prejuízo algum para a mente e para o corpo. Há muitos casos de pessoas que pertenciam a uma religião e ao deixarem se tornaram pessoas de má vida, ou passaram a fazer uso de drogas. Era uma fé sem raízes, que não desencadeou um processo de transformação real no caráter, não suprimiu lacunas emocionais.
Entrevista
Gabi: O uso de drogas esta relacionado de alguma forma com a busca pela felicidade, ou pela realização pessoal?

Ronaldo: Sem dúvida alguma há uma relação, mas nesse caso a busca foi orientada para caminhos danosos. Se o homem não esta apto a encontrar dentro de si mesmo recursos para se sentir feliz, ou para enfrentar os problemas da vida de uma forma lúcida e produtiva, ele esta desviado de sua propria natureza. No caso do ser humano, não progredir como pessoa pode significar que se esta em processo de estagnação, ou pior ainda de deterioração. A droga rouba do indivíduo a sua característica afetiva e racional, ou seja, desumaniza-o. Nós precisamos melhorar o nível educacional das famílias, pois as pessoas precisam aprender a cuidar do seu desenvolvimento desde cedo.

Gabi: Obrigado Ronaldo, e até a próxima semana aqui no Show de Domingo.


Entrevista realizada no estúdio da Rádio Geração 2000 - Teresópolis RJ, em março de 2009.

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